tag:blogger.com,1999:blog-56871341878511787162024-02-08T20:31:56.211+01:00"as palavras estão gastas"porque as palavras estão gastas, mas não morreramMário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.comBlogger51125tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-20084844790954190082007-05-03T18:49:00.000+00:002007-05-03T18:51:11.631+00:00Cemitério de Pianos - EXCERTO<div style="text-align: justify;"><span style="font-family: trebuchet ms;">nunca mais voltou a trabalhar com o meu pai na oficina. Depois de tirar as ligaduras, usou durante semanas a pala de couro que lhe deram no hospital. Um dia, apareceu com o olho limpo e destapado. A pálpebra estendida e branca sobre o olho vazio. No hospital, o doutor disse-lhe que podia voltar a fazer tudo o que fazia antes; mas quando o Simão falava de voltar para a oficina como aprendiz, o meu pai falava de muitas coisas e, sempre por outras palavras, mostrava-lhe que não podia ser. Pedia-lhe que esperasse um pouco mais e mudava de assunto. Numa noite, ao jantar, ainda não tinha feito doze anos, o meu irmão resolveu dizer-nos que tinha arranjado trabalho a dar serventia de pedreiro. Essa foi a primeira vez que o meu pai lhe bateu depois da tarde em que perdeu a vista. Depois dessa ocasião, zangou-se com ele muitas vezes e bateu-lhe muitas vezes. Ao longo de todos estes anos, nunca se zangou comigo e nunca me bateu. Sempre foi claro para mim que o meu pai se zangava e batia no meu irmão porque essa era a sua forma de lidar com a tristeza, com a mágoa que sentiu a partir daquela tarde em que o meu irmão ficou cego de um olho. Essa era a sua forma de o castigar. Sempre foi igualmente claro para mim que o meu pai não se zangava comigo e não me batia pela mesma razão. Essa era a sua forma de me castigar.</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;"></span></div><span style="font-family: trebuchet ms;"><br /></span><div style="text-align: right;"><span style="font-family: trebuchet ms; font-style: italic; font-weight: bold;">José Luís Peixoto</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;"></span></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-8581772907315276282007-05-03T18:43:00.000+00:002007-05-03T18:45:29.944+00:00Objecto Quase - Contos<div style="text-align: justify;"><span style="font-family: trebuchet ms;">O ditador caiu duma cadeira, os árabes deixaram de vender petróleo, o morto é o melhor amigo do vivo, as coisas nunca são o que parecem, quando vires um centauro acredita nos teus olhos, se uma rã escarnecer de ti atravessa o rio. Tudo são objectos. Quase.</span><br /></div><br /><div style="text-align: right;"><span style="font-family: trebuchet ms; font-style: italic; font-weight: bold;">José Saramago</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-25897344695762334692007-04-30T15:44:00.000+00:002007-04-30T15:46:10.466+00:00Sobre o Poema<p style="font-family: trebuchet ms;">Um poema cresce inseguramente<br />na confusão da carne,<br />sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,<br />talvez como sangue<br />ou sombra de sangue pelos canais do ser.</p> <p style="font-family: trebuchet ms;">Fora existe o mundo.<br />Fora, a esplêndida violência<br />ou os bagos de uva de onde nascem<br />as raízes minúsculas do sol.<br />Fora, os corpos genuínos e inalteráveis<br />do nosso amor,<br />os rios, a grande paz exterior das coisas,<br />as folhas dormindo o silêncio,<br />as sementes à beira do vento,<br />— a hora teatral da posse.<br />E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.<br /></p><p style="font-family: trebuchet ms;">E já nenhum poder destrói o poema.<br />Insustentável, único,<br />invade as órbitas, a face amorfa das paredes,<br />a miséria dos minutos,<br />a força sustida das coisas,<br />a redonda e livre harmonia do mundo. </p> <p style="font-family: trebuchet ms;">— Embaixo o instrumento perplexo ignora<br />a espinha do mistério. </p> <p style="font-family: trebuchet ms;">— E o poema faz-se contra o tempo e a carne.</p><div style="text-align: right;"><span style="font-family: trebuchet ms; font-weight: bold; font-style: italic;">Herberto Hélder</span><br /></div><p style="font-family: trebuchet ms;"></p>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-13597537191571200942007-04-02T18:40:00.000+00:002007-04-02T18:42:14.306+00:00E eu digo-lhe<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">E eu digo-lhe, que não são<br />vãos os anos que vivi,<br />nem inúteis os caminhos percorridos,<br />ou sem objectivo tudo o que ouvi.<br />Não são imunes ao mundo,<br />nem são imaginariamente uma prenda de anos,<br />os amores em vão também não foram,<br />amores fraudulentos ou doentes,<br />a sua luz limpa e imortal<br />sempre em mim,<br />sempre de mim.<br />E nunca é tarde para de novo<br />começar toda a vida,<br />encetar o caminho,<br />para que do passado – nem uma palavra,<br />nem um gemido seja destruído.</p><span style="font-size:78%;"><br /><br /><span style="font-style: italic;">Tradução de Manuel de Seabra.</span></span> <p style="text-align: right;" class="MsoNormal"><span style="font-family: trebuchet ms; font-weight: bold; font-style: italic;">Olga Berggolts</span><br /></p>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-48940442432768424862007-04-02T18:37:00.000+00:002007-04-02T18:38:56.891+00:00Da metáfora como charrua<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">O votivo eco da chuva nas mudas<br />searas do verão onde percebemos,<br />até onde o olhar alcança, o movimento<br />dissonante de dois rapazes espantando<br />pardais, o último rastilho da inocência.<br />Eis o imperturbável fôlego da metáfora<br />devassando os diáfanos campos da mente,<br />hoje, quando o candente minério das coisas<br />se converte noutra possibilidade. A evasiva<br />liberdade do entardecer o desejado antídoto<br />para a natureza do espírito alienado.</p> <div style="text-align: right;"><span style="font-weight: bold; font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >Paulo Teixeira</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-73840803336706273232007-04-02T18:35:00.000+00:002007-04-02T18:36:38.886+00:00<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">delírio dor febre rio onde tinha as raízes<br />deste desencanto das coisas diariamente traindo-se<br />quando nem mesmo na água me distendia<br />(nem seria provavelmente pela ausência de janela<br />donde dependurar as mãos-apaziguamento)<br />ou seja quando nem mesmo o púbis à tona do banho<br />escavava na inércia uma presença de espuma.<br />e por que havia de? às vezes era o enfado<br />tão bastas vezes em dados tempos que:<br />os olhos longe a boca uma linha por cortar<br />os seios imóveis na concha do soutien o ventre<br />de duna achatando-se paulatinamente o umbigo<br />sentinela na guarida o sexo retomando por desfastio<br />memórias idas as coxas diapasão inútil entre lençóis<br />os tornozelos cianosados os miolos enfim no topo<br />da pirâmide como entulho. que paisagem esta assim?<br />delírio febre contusão e o sono abrindo-se tão alto<br />como a lua nesse crescendo dela consumindo-se<br />até que tudo não fosse mais que rasgão.</p> <div style="text-align: right;"><span style="font-family: trebuchet ms; font-weight: bold; font-style: italic;">Wanda Ramos</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-25538951088591949192007-04-02T18:32:00.000+00:002007-04-02T18:33:27.343+00:00As palavras<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Seguram desiguais o mesmo fio<br />que as trespassa – já foram<br />mais velhas, mais outras, precisas,<br />alheias, talvez, e voltaram, serão<br />vizinhas, repetem, parentes ou não,<br />não sabem: contêm.<br />São círculos d’água e o sonho<br />de um centro qualquer como rosa<br />ou nome de barco, anúncio, decreto<br />ou poema;<br />poema como o limiar do estio<br />numa voz, nuns lábios e sempre.</p> <div style="text-align: right;"><span style="font-family: trebuchet ms; font-weight: bold; font-style: italic;">Vítor Matos e Sá</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-2012099857658443462007-04-02T18:29:00.000+00:002007-04-02T18:31:02.252+00:00Cão Atómico<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">1.<br /><br />Este cão tem folhas nas orelhas,<br />Com quatro talos:<br />Mas o que este cão devia ter era calos,<br />E só tem olhos e ossos<br />E morrinha num dente!<br />Mas, meu Deus, este cão<br />Quase o diria meu irmão:<br />Parece gente!<br /><br />2.<br /><br />Este cão é redondo. Está deitado,<br />Rosna com gengivas de uivo.<br />Dizem-me que foi lobo,<br />Mas perdeu a alcateia<br />Como os homens perderam a Razão,<br />Que hoje serve de osso ao cão<br />Escapo ao cogumelo nuclear.<br />E por essa razão se foi deitar.</p> <div style="text-align: right;"><span style="font-family: trebuchet ms; font-weight: bold; font-style: italic;">Vitorino Nemésio</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-14073605381710777762007-04-02T18:27:00.000+00:002007-04-02T18:28:46.059+00:00Poética<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">De manhã escureço<br />De dia tardo<br />De tarde anoiteço<br />De noite ardo.<br /><br />A oeste a morte<br />Contra quem vivo<br />Do sul cativo<br />O oeste é meu norte.<br /><br />Outros que contem<br />Passo por passo:<br />Eu morro ontem<br /><br />Nasço amanhã<br />Ando onde há espaço:<br />- Meu tempo é quando.</p> <div style="text-align: right;"><span style="font-family: trebuchet ms; font-weight: bold; font-style: italic;">Vinícius de Moraes</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-59313746882693586782007-03-30T00:10:00.000+00:002007-03-30T00:11:52.056+00:00a árvore<span style="font-family: trebuchet ms;">Chegaste</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">com a tua tesoura de jardineiro</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">e começaste a cortar:</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">umas folhas aqui e ali</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">uns ramos</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">que não doeram...</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">Eu estava desprevenida</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">quando arrancaste a raiz.</span><br /><br /><div style="text-align: right;"><span style="font-family: trebuchet ms; font-weight: bold; font-style: italic;">Yvette Centeno</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-89821219042891210462007-03-30T00:08:00.000+00:002007-03-30T00:09:19.108+00:00poema para o meu amor doente<span style="font-family: trebuchet ms;">hoje roubei todas as rosas dos jardins</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">e cheguei ao pé de ti</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">de mãos vazias.</span><br /><br /><div style="text-align: right;"><span style="font-family: trebuchet ms; font-weight: bold; font-style: italic;">Eugénio de Andrade</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-63314044820551913512007-03-29T18:56:00.000+00:002007-03-29T18:58:53.730+00:00Segue o teu destino<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Segue o teu destino,<br />Rega as tuas plantas,<br />Ama as tuas rosas.<br />O resto é a sombra<br />De árvores alheias.<br /><br />A realidade<br />Sempre é mais ou menos<br />Do que nós queremos.<br />Só nós somos sempre<br />Iguais a nós-próprios.<br /><br />Suave é viver só.<br />Grande e nobre é sempre<br />Viver simplesmente.<br />Deixa a dor nas aras<br />Como ex-voto aos deuses.<br /><br />Vê de longe a vida.<br />Nunca a interrogues.<br />Ela nada pode<br />Dizer-te. A resposta<br />Está além dos deuses.<br /><br />Mas serenamente<br />Imita o Olimpo<br />No teu coração.<br />Os deuses são deuses<br />Porque não se pensam.</p> <div style="text-align: right;"><span style="font-family:trebuchet ms;"><span style="font-weight: bold; font-style: italic;">Ricardo Reis</span> (Fernando Pessoa)</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-82794799312914406952007-03-29T18:52:00.000+00:002007-03-29T18:53:53.848+00:00Credo<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">As infinitas<br /><br />pequenas coisas. Por uma vez respirar tão-só<br />na luz das infinitas<br /><br />pequenas coisas<br />que nos rodeiam. Ou nada<br />pode escapar<br /><br />ao encanto desta escuridão, o olhar<br />descobrirá que somos apenas<br />o que nos fez<br />menos do que somos. Nada a dizer. Dizer:<br />as nossas vidas mesmas<br /><br />dependem disso.</p> <div style="text-align: right;"><span style="font-family: trebuchet ms; font-weight: bold; font-style: italic;">Paul Auster</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-65830438631019273222007-03-29T15:27:00.000+00:002007-03-29T15:31:00.441+00:00Bebendo vinho com alguns contemporâneos<div align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">Os malefícios da multidão.</span></div><span style="font-family:trebuchet ms;">As sequóias sequiosas na sequência das secas.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">As consequências de um choro na configuração do rosto.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">A erva destrói o exterior da moradia.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">O tédio é fraca compensação dos compromissos.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;"></span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Que dizeis a este fim de caminho, onde o escritor recupera</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">a verdadeira solenidade da Afirmação?</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Não conheço outro modo de escrever, isto é,</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">de substituir ao arrojo invertebrado da juventude</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">a coragem de uma lúcida conveniência. Assim,</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">renuncio ao pessimismo em proveito de outros sentimentos</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">mais fecundos – o nojo, o orgulho, o desejo nunca satisfeito.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;"></span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Se acaso me ouvis</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">-não terei eu razão?</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;"></span><br /><div align="right"><span style="font-family:trebuchet ms;"><strong><em>Nuno Júdice</em></strong></span></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-57134663886033101482007-03-29T15:23:00.000+00:002007-03-29T15:25:55.302+00:00Geórgica<span style="font-family:trebuchet ms;">Se gostas de maçãs, colhe maçãs</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Do teu próprio pomar.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Guarda republicana há sempre em toda a parte</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Onde não temos nada,</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">E a força é cega por definição.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Ora no teu pomar</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Podes serenamente</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Gozar o transitório paraíso.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Na pequenina haste</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Que um dia tu plantaste</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Nasceram frutos túmidos e doces</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Que são teus.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Colhe, pois, esses frutos.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Não faças como o Adão e como a Eva, uns brutos</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Que comeram maçãs, mas do pomar de Deus.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;"></span><br /><div align="right"><span style="font-family:trebuchet ms;"><strong><em>Miguel Torga</em></strong></span></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-43407239328064483122007-03-26T20:16:00.000+00:002007-03-26T20:28:10.024+00:00Salazar - O Grande Português (dizem os portugueses)<span style="font-family:trebuchet ms;">"um povo culto é um povo infeliz"</span><br /><br /><div align="right"><span style="font-family:trebuchet ms;"><strong><em>António de Oliveira Salazar</em></strong></span></div><div align="right"><strong><em><span style="font-family:Trebuchet MS;"></span></em></strong></div><div align="right"><span style="font-family:Trebuchet MS;"></span></div><div align="left"><span style="font-family:Trebuchet MS;"></span></div><div align="left"><span style="font-family:Trebuchet MS;"><em></em></span></div><div align="left"><span style="font-family:Trebuchet MS;"><em></em></span></div><div align="left"><span style="font-family:Trebuchet MS;"><em></em></span></div><div align="center"><span style="font-family:Trebuchet MS;font-size:85%;">...</span></div><div align="center"><span style="font-size:85%;"></span></div><div align="left"><span style="font-family:Trebuchet MS;font-size:85%;"></span></div><div align="left"><span style="font-family:Trebuchet MS;font-size:85%;">Digo-vos, e dúvidas não as há, o povo português é realmente um povo feliz.</span></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-32000455030656120912007-03-25T18:48:00.000+00:002007-03-25T18:49:19.120+00:00<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Homens que são como lugares mal situados<br />Homens que são como casas saqueadas<br />Que são como sítios fora dos mapas<br />Como pedras fora do chão<br />Como crianças órfãs<br />Homens agitados sem bússola onde repousem<br /><br />Homens que são como fronteiras invadidas<br />Que são como caminhos barricados<br />Homens que querem passar pelos atalhos sufocados<br />Homens sulfatados por todos os destinos<br />Desempregados das suas vidas<br /><br />Homens que são como a negação das estratégias<br />Que são como os esconderijos dos contrabandistas<br />Homens encarcerados abrindo-se com facas<br /><br />Homens que são como danos irreparáveis<br />Homens que são sobreviventes vivos<br />Homens que são sítios desviados<br />Do lugar</p> <p style="font-weight: bold; font-style: italic; text-align: right; font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Daniel Faria</p>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-6559251200318363102007-03-25T18:47:00.001+00:002007-03-25T18:47:25.063+00:00De Tarde<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Naquele pic-nic de burguesas,<br />Houve uma coisa simplesmente bela,<br />E que, sem ter história nem grandezas,<br />Em todo o caso dava uma aguarela.<br /><br />Foi quando tu, descendo do burrico,<br />Foste colher, sem imposturas tolas,<br />A um granzoal azul de grão-de-bico<br />Um ramalhete rubro de papoulas.<br /><br />Pouco depois, em cima duns penhascos,<br />Nós acampámos, inda o Sol se via;<br />E houve talhadas de melão, damascos,<br />E pão-de-ló molhado em malvasia.<br /><br />Mas, todo púrpuro a sair da renda<br />Dos teus dois seios como duas rolas,<br />Era supremo encanto da merenda<br />O ramalhete rubro de papoulas!</p> <p style="font-weight: bold; font-style: italic; text-align: right; font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Cesário Verde</p>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-32703084633991190062007-03-25T18:44:00.001+00:002007-03-25T18:44:54.378+00:00Triste quem ama, cego quem se fia<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Triste quem ama, cego quem se fia<br />Da feminina voz na vã promessa!<br />Aspira a vê-la estável! Mais depressa<br />O facho apagará, que espalha o dia.<br /><br />Alada exalação, que na sombria<br />Tácita noite os ares atravessa,<br />Foi comigo a paixão volúvel de essa<br />Que o peito me afagava e me feria.<br /><br />Do desengano o bálsamo lhe aplico,<br />E a teus laços, Amor, sem medo exponho<br />Dos benéficos céus o dom mais rico.<br /><br />Vejo mil Circes, plácido, risonho;<br />E se fé me prometem, ouço, e fico<br />Com quem despertou de aéreo sonho.</p> <p style="font-weight: bold; font-style: italic; text-align: right; font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Bocage</p>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-24446863414721044642007-03-25T18:41:00.000+00:002007-03-25T18:42:25.131+00:00Homem<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Inútil definir este animal aflito.<br />Nem palavras,<br />nem cinzéis,<br />nem acordes,<br />nem pincéis,<br />são gargantas deste grito.<br />Universo em expansão.<br />Pincelada de zarcão<br />Desde mais infinito a menos infinito.</p> <div style="text-align: right;"><span style="font-weight: bold; font-style: italic; font-family: trebuchet ms;">António Gedeão</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-4240949092995162702007-03-25T18:38:00.000+00:002007-03-25T18:39:49.939+00:00a vida de família<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">a vida de família tornou-se bem difícil<br />com as contas a pagar os filhos a fazer<br />ou a evitar a ranhoca a limpar<br />a vida de família não tem razão de ser<br />não tem ração de querer<br /><br />a vida de família jangada da medusa<br />é o tablado da antropofagia<br /><br />mas ficam os retratos cristo virgem maria<br />e os sobreviventes, que vão chupando os dentes</p> <p style="font-family: trebuchet ms; font-weight: bold; font-style: italic; text-align: right;" class="MsoNormal">Alexandre O'Neill</p>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-27458429017362255592007-03-25T18:34:00.000+00:002007-03-25T18:37:14.327+00:00Falas de Civilização<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Falas de civilização, e de não dever ser,<br />Ou de não dever ser assim.<br />Dizes que todos sofrem, ou a maioria de todos,<br />Com as cousas humanas postas desta maneira.<br />Dizes que se fossem diferentes, sofreriam menos.<br />Dizes que se fossem como tu queres, seria melhor.<br />Escuto sem te ouvir.<br />Para quê te quereria eu ouvir?<br />Ouvindo-te nada ficaria sabendo.<br />Se as cousas fossem diferentes, seriam diferentes: eis tudo.<br />Se as cousas fossem como tu queres, seriam só como tu queres.<br />Ai de ti e de todos que levam a vida<br />A querer inventar a máquina de fazer felicidade!</p><p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal"></p><div style="text-align: right;"><span style="font-family: trebuchet ms;"><span style="font-weight: bold; font-style: italic;">Alberto Caeiro</span> (Fernando Pessoa)</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-66630365712916536002007-03-25T18:30:00.000+00:002007-03-25T18:32:12.642+00:00Se houvesse...<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Se houvesse degraus na terra e tivesse anéis o céu,<br />eu subiria os degraus e aos anéis me prenderia.<br />No céu podia tecer uma nuvem toda negra.<br />E que nevasse, e chovesse, e houvesse luz nas montanhas,<br />e à porta do meu amor o ouro se acumulasse.</p> <p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Beijei uma boca vermelha e a minha boca tingiu-se,<br />levei um lenço à boca e o lenço fez-se vermelho.<br />Fui lavá-lo na ribeira e a água tornou-se rubra,<br />e a fímbria do mar, e o meio do mar,<br />e vermelhas se volveram as asas da águia<br />que desceu para beber,<br />e metade do sol e a lua inteira se tornaram vermelhas.<br /></p> <p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">Maldito seja quem atirou uma maçã para o outro mundo.<br />Uma maçã, uma mantilha de ouro e uma espada de prata.<br />Correram os rapazes à procura da espada,<br />e as raparigas correram à procura da mantilha,<br />e correram, correram as crianças à procura da maçã.</p><p style="text-align: right;" class="MsoNormal"><span style="font-family: trebuchet ms; font-weight: bold; font-style: italic;">Herberto Hélder</span><br /></p>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-56672836557176615112007-03-25T18:21:00.000+00:002007-03-25T18:32:35.223+00:00<p style="font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">O Herberto Hélder tem duas<br />pernas e dois braços, dois olhos,<br />tem nariz e boca e come, vive<br />numa casa, espreita pelas janelas,<br />por vezes sai à rua, sozinho ou<br />acompanhado, a falar, apanha<br />chuva, liga a televisão, sabe onde<br />fica a França, lembra-se quando<br />era pequenino, inclusive<br />teve mãe e pai. É<br />impressionante o quanto um poeta<br />se pode assemelhar<br />às pessoas! A última vez que<br />falei com ele mandou-me um abraço.</p> <p style="font-weight: bold; font-style: italic; text-align: right; font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal">valter hugo mãe</p> <div style="text-align: right;"><em style="font-family:trebuchet ms;"><span style="font-weight: bold;"></span></em><br /><em style="font-family: trebuchet ms;"></em></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5687134187851178716.post-12092711346039488422007-03-25T18:17:00.000+00:002007-03-25T18:19:19.931+00:00RELEVO<span style="font-family: trebuchet ms;">iam ao longo das palmeiras</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">com o deserto na sede</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">do olhar levavam tâmaras</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">secas o perfil suavíssimo</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">das ameias</span><br /><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">e se paravam a interrogar</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">o vento</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">uma cabra alvorecia</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">atrás do mar</span><br /><br /><div style="text-align: right;"><span style="font-family: trebuchet ms; font-weight: bold; font-style: italic;">José Manuel Mendes</span><br /></div>Mário Martinshttp://www.blogger.com/profile/17266029935746742923noreply@blogger.com0